Perfeição

Cirurgia ao estado de espírito

Com as inovações no ramo da medicina, as cirurgias plásticas e estéticas são cada vez mais procuradas. Esta reportagem não só dá a conhecer as histórias da Madalena e da Maria, que optaram por realizar cirurgias plásticas para se sentirem mais confortáveis e felizes com o seu corpo, como também explica, com a ajuda do cirurgião Daniel Travancinha, como todo o processo cirúrgico funciona.

David Martins, Hugo Costa, João Espada, João Cardoso, Nuno Cabral

Madalena Pena, estudante de dezanove anos da Universidade Lusófona de Lisboa, acordou da sua operação plástica com a mesma dúvida que preocupa muita gente naquele momento: será que correu tudo bem? Após vários anos de inseguranças relacionadas com o seu peito tinha chegado a altura certa. Será que a operação, que iria reduzi-lo, cumpriu o objetivo? Será que ia ficar feliz com o resultado?

Madalena conta-nos que o período pré-operativo (período antes de ser feita a operação) foi o mais difícil. Há vários meses que estava na fila de espera para realizar a cirurgia. No entanto, as dúvidas começaram a aparecer. Quando já estava tudo pronto, testou positivo à Covid-19 e a operação teve de ser adiada.

Já Maria Carolina, estudante de vinte anos da Escola Superior de Comunicação Social, que realizou uma rinoplastia (corrigiu não só a função do nariz, como também a parte estética do mesmo), esperou pouco tempo para que a cirurgia fosse marcada: “Ligaram numa quarta-feira à minha mãe para saber se eu queria ser operada na sexta-feira seguinte”.

A grande maioria das técnicas cirúrgicas e de procedimentos não cirúrgicos estão, dia após dia, a evoluir no sentido de agredir cada vez menos os tecidos orgânicos. Com o avançar da tecnologia é possível prever não só o presente, como também o futuro das operações plásticas.

As cirurgias plásticas são procuradas com o intuito de melhorar a aparência física, seja através de pequenas alterações ou de procedimentos mais complicados.

Quando pensamos no futuro da medicina nesta área, podemos pensar sobretudo em procedimentos estéticos menos invasivos, ou seja, que ultrapassem cada vez menos as barreiras naturais da pele, e, consequentemente, tenham um menor tempo de recuperação pós-procedimento. Foi o que aconteceu no caso da Madalena. A sua operação foi muito pouco invasiva, o que facilitou a sua recuperação: “Tenho uma pequena marca no peito, que mal se nota hoje em dia. As outras pessoas não conseguem dizer se eu fiz uma plástica ou não”.

De acordo com o Doutor Daniel Travancinha, cirurgião com largos anos de experiência, e que trabalha, atualmente, no Hospital Garcia da Orta, as operações plásticas são cada vez mais modernas e acessíveis para a população. Atualmente, não só é muito mais fácil contactar uma clínica ou um cirurgião, como também os preços são mais acessíveis, devido à crescente procura por este tipo de procedimentos cirúrgicos. Segundo um artigo publicado pelo jornal Público, em 2017, “nos Estados Unidos – o maior mercado de medicina e cirurgia estética a nível mundial –, registou-se um aumento de 11% nos gastos em todo o tipo de procedimentos, de 2015 para 2016”.

A modernização da tecnologia e da robótica facilitam cada vez mais o processo de recuperação dos pacientes. O processo cirúrgico está cada vez mais moderno. O cirurgião dá o exemplo da lipoaspiração (operação cirúrgica estética que remove gordura de diversos locais diferentes do corpo), em que, atualmente, se coloca uma câmara dentro do abdómen do paciente para facilitar a operação, o que permite ao cirurgião uma melhor visão do interior do abdómen do paciente enquanto opera. Isto seria impensável há cinquenta anos.

Maria Carolina, por sua vez, compara os métodos usados na sua cirurgia com os que foram utilizados na da sua mãe, também submetida à mesma cirurgia, devido a problemas respiratórios: “Um dos riscos era ter uma hemorragia e até um corte mais profundo da cartilagem. Ficar um género de buraco nas narinas (devido às técnicas de corte mais invasivas da altura). Isso aconteceu à minha mãe, há vinte e tal anos”.

A maior preocupação dos pacientes é a segurança dos procedimentos. A segunda é a rapidez de recuperação. Em relação a isto, o cirurgião Daniel Travancinha é bastante claro: “As grandes intervenções cirúrgicas, que acarretem um risco maior de complicações e exijam um tempo de recuperação mais longo, serão substituídas por técnicas menos invasivas, que tragam maior previsibilidade de resultados, tenham uma incidência de complicações menor e que levem a um tempo de recuperação inferior”.

No entanto, por mais máquinas que existam e por mais e melhor tecnologia que possa surgir, o motor fundamental da operação é o cirurgião, a parte humana do processo. O Doutor Daniel Travancinha alerta para a autorresponsabilização e necessidade de competência especializada por parte dos médicos, já que o profissional deve ser conhecedor não só de técnicas anestésicas, como também da fisiologia do paciente como um todo, pois todos os medicamentos e modalidades de anestesia têm potenciais efeitos adversos no organismo. O sistema circulatório e o coração estão particularmente vulneráveis em todo este processo. A instituição hospitalar dispõe de todo o tipo de monitores, equipamentos e instrumentos cirúrgicos modernos, mas a melhor forma de monitorizar o fundamental processo pós-operatório é através da própria equipa médica. De modo a prevenir possíveis complicações, como hematomas e infeções, é necessário saber como o corpo reage ao longo do tempo.

Questionado sobre qual é a sua opinião em relação à inovação e ao grande salto da cirurgia plástica, o cirurgião afirma que, hoje em dia, o grande objetivo é “tentar parecer que as cirurgias não foram feitas”. Com a inovação tecnológica e o maior conhecimento dos cirurgiões, isso é cada vez mais fácil de acontecer. “A evolução acompanha, em regra, a reconstrução”. Os avanços tecnológicos, informáticos, digitais e as novas técnicas permitem que sejam criados tecidos que podem substituir facilmente outros tecidos humanos, possibilitando assim que a reconstrução não deixe tantas marcas no paciente. Uma das principais ideias transmitidas pelo cirurgião Daniel Travancinha é que “a cirurgia plástica reconstrutiva tem aumentado e os seus avanços são visíveis”.

Em relação às visões sobre as cirurgias plásticas estéticas, o cirurgião considera estarem dependentes das modas e do que cada um pensa ser o melhor para si. Em certas zonas do mundo, diz-nos o Doutor Daniel Travancinha que a obesidade é enaltecida, o que prova a diferença de entendimento do que é um corpo perfeito, que difere de país para país. Na verdade, a definição de beleza estética está sempre dependente da cultura.

Atualmente, as operações estéticas mais populares variam consoante a idade. Miguel Andrade, cirurgião plástico e diretor clínico do Centro Clínico e Cirúrgico Faccia, indica, em declarações ao jornal Público, que na faixa mais jovem entre os 18 e os 22 anos se procura frequentemente o realce dos lábios e o contorno da face. Mais tarde, entre os 25 e os 45 anos, quando “já se perdeu algum volume”, os tratamentos passam a focar-se no rejuvenescimento, com o uso de vitaminas, ácido hialurónico e hidratação profunda, por exemplo – estas duas faixas etárias representam cerca de 20% e 60%, respetivamente, do total de pacientes da clínica. Há ainda uma procura elevada deste tipo de tratamentos entre os 55 e os 65 anos, quando no rosto “já estão marcados outros tipos de sinais”.

A vertente psicológica é o principal fator que motiva as pessoas a realizar cirurgias plásticas.

As cirurgias plásticas com objetivos estéticos estão intimamente ligadas ao bem-estar psicológico. O impacto na autoestima é imediato, de acordo com os dados comprovados cientificamente há relativamente pouco tempo. Em 2013, um grupo de cientistas estudou o efeito real que os procedimentos têm sobre a saúde mental dos pacientes. A revista científica Clinical Psychological Science publicou um estudo que analisou os efeitos psicológicos em pacientes submetidos à cirurgia plástica. A pesquisa foi aplicada em pouco mais de 500 pacientes, que apresentaram uma melhoria significativa na autoestima após a intervenção.

Uma alteração na aparência, por menor que seja, pode trazer grandes benefícios para os pacientes. Madalena Pena é exemplo disso. Após a operação ao peito, a confiança e autoestima aumentaram: “Ganhei tanta confiança. Estou mais à vontade”. A nível psicológico, estas cirurgias podem ter uma importância muito significativa.

Questionada sobre se sentiria à vontade para fazer outro tipo de cirurgia plástica, Maria Carolina respondeu que, se sentisse algum desconforto em relação ao seu corpo e a operação melhorasse a sua situação, não hesitaria, afirmando: “Nós vamos viver connosco até ao fim da nossa vida… por isso, o mínimo que podemos fazer é vivermos bem connosco mesmos e sentirmo-nos bem psicologicamente e fisicamente. Se a cirurgia ajudar a que seja a melhor versão de mim mesma, então faria outra”.

O cirurgião Daniel Travancinha defende que as cirurgias estéticas têm um papel determinante para o bem-estar físico e psicológico. Apesar de consciente de todos os riscos das cirurgias estéticas, garante que o facto de o paciente poder sentir-se bem consigo mesmo sobrepõe-se, muitas vezes, aos riscos, ajudando as pessoas que procuram uma imagem perfeita através de operações plásticas a alcançarem estabilidade a nível psicológico.

Apesar de todas as inovações, os pacientes correm riscos nas intervenções cirurgias.

Mesmo com todas as inovações nas cirurgias plásticas, o Doutor Daniel Travancinha afirma que, apesar de a probabilidade de ocorrer um problema durante o período operativo ser baixa, este tipo de operações não é isento de riscos para a saúde. O risco anestésico-cirúrgico tem uma probabilidade de trazer complicações para o paciente. De acordo com o cirurgião, essas ocorrências estão sujeitas a vários fatores, como o estado de saúde do paciente, a qualificação profissional da equipa médica, ou a técnica operatória e condições da instituição hospitalar.

Maria Carolina, quando questionada sobre o pós-cirurgia, afirma que os resultados são bastantes positivos e visíveis, tanto a nível estético como funcional. “Eu respiro 200% melhor do que antes e até a minha voz mudou. Antes era muito nasalada”. A nível estético também se nota uma grande diferença. Antes da operação tinha um alto enorme no nariz”.

Porém, nem sempre tudo corre bem. Maria Carolina conta-nos que, na sua cirurgia, os resultados demoraram a aparecer: “Mesmo passado um ano, o nariz ainda está muito inchado. Ainda não tem o aspeto que irá ter no final”. Horas após a realização da operação, já recuperada da anestesia, Madalena Pena começou a sentir um forte peso e uma angustiante dor no peito. Felizmente, não houve motivos para grande preocupação, porque não houve complicações graves.

“Recomendo as operações plásticas às outras pessoas e não fecho a porta a voltar a fazer”. A cirurgia de Madalena, para além de lhe ter trazido benefícios na vertente psicológica, também lhe proporcionou uma melhoria na qualidade de vida: “Ainda é muito chocante para mim ir a uma discoteca ou ir a um sítio qualquer e poder saltar. Para mim ainda é um milagre. Eu, com o peito que tinha, não conseguia correr, não conseguia saltar, não conseguia fazer nada”.

Mesmo com os avanços da tecnologia nos últimos anos, ainda é recorrente a ideia de que as cirurgias são muito perigosas. “Para quê correr esse risco, sendo tão nova?” Madalena lidou com este tipo de críticas após fazer a sua operação, provenientes sobretudo de pessoas mais velhas. Mas, podemos colocar a questão de outra forma: será que as inovações nas operações plásticas vão conseguir tornar os benefícios destas intervenções menos arriscados, particularmente, para o nosso estado de espírito?